IV Colóquio Internacional de Análise do Discurso
O que produz o entendimento e o
desentendimento entre os sujeitos de uma sociedade? Mais fundamentalmente, o
que a constitui? Há efetiva compreensão entre seus membros, porque são eles
falantes de uma mesma língua? Quais são os papéis desempenhados pela linguagem,
pelas línguas e pelos discursos nos consensos e nos conflitos sociais? Essas e
outras questões da mesma natureza acompanham o pensamento humano há milênios e
voltam a nos frequentar mais intensa e particularmente em nosso mundo
contemporâneo, marcado ao mesmo tempo, mas não na mesma medida, por lutas
necessárias e reivindicações justas e por hegemonias, radicalismos e
intolerâncias.
Em nossos tempos, o Mercado liberal, a Mídia
tradicional e a Política conservadora não cessam de produzir e de veicular em
consonância suas loas às práticas e aos valores do consumo e da democracia à
moda ocidental. Já ouvimos, inclusive, o decreto do “fim da História”, com o
alcance do que seriam os perfeitos sistema de produção e regime de governo: a
Democracia capitalista. Assim, supostamente as lutas entre os “senhores” e os
“escravos”, entre os “dominantes” e os “dominados”, entre, enfim, abastados e
desvalidos de distintas sortes já não teriam mais razão de ser. Com a
consolidação da Internet e, mais recentemente, das redes sociais, as benesses
do sistema e do regime ganhariam um novo aliado: a tão almejada liberdade de
expressão. Sua demanda, seu anúncio e exercício talvez possam ser em nossas
bocas, com mais frequência do que gostaríamos, mais repetições que nos foram
sugeridas do que diferenças que teríamos efetivamente conquistado. Sabemos, porém,
que nas relações humanas não existem apenas reproduções e automatismos. Ante as
estratégias de controle do poder de várias ordens, há a possibilidade de lhes
confrontarmos com táticas e resistências. Estas últimas, entretanto, não são
fenômenos naturais, cujo advento seria promovido sem árduas batalhas e
dolorosas conquistas. Se assim não fosse, teríamos de fato chegado ao fim da
História…
Essas considerações não respondem ainda direta
e suficientemente às questões que lançamos acima, às quais, aliás, somam-se
outras: há mais consensos ou conflitos na história humana? Dispõem eles do
mesmo peso e espaço na construção e no esgarçamento dos laços sociais? Ao
falarem, os homens tendem a enxergar mais identidades ou mais diferenças entre
si? E quanto a nós, estudiosos do discurso, observamos antes as unidades
discursivas, onde se cria à primeira vista haver uma mera diversidade de falas,
de enunciados ou de textos; ou buscamos principalmente demonstrar a existência
das distintas posições enunciativas e/ou ideológicas, onde se acreditava
existir a simples unidade de uma instituição, de um campo ou de uma formação
discursiva?
Em diversas tendências da Análise do discurso,
parece ter ocorrido inicialmente o predomínio da identificação das
homogeneidades discursivas; em seguida, por meio de seus desenvolvimentos e de
seus diálogos com outras áreas do conhecimento, tais como a Teoria da
enunciação, os estudos do Círculo de Mikhail Bakhtin, a obra de Michel
Foucault, a Nova História, entre outros, os analistas estabeleceram as
distintas formas da heterogeneidade como uma sua prioridade. Numa ou noutra
visada, a tarefa não é menos espinhosa: na diversidade das falas, o que deve
ser entendido como o mesmo discurso? Como identificá-lo? Por que meios
estabelecer as fronteiras entre um e outro discurso? Por outro lado, o que é o
Outro numa ou de uma formação discursiva? Quais são suas funções e seus
diferentes graus de presença na constituição de um discurso?
Foi com o propósito de refletirmos sobre esses
e outros fatos do discurso e com vistas a formular respostas a essas questões,
que em sua quarta edição o Colóquio
Internacional de Análise do discurso elegeu como seu tema “A produção dos consensos e a conquista das
resistências”. Para explorá-lo, debatê-lo e analisá-lo, o IV CIAD contará com a presença de
eminentes especialistas dos estudos do discurso, cujos trabalhos sobre os
fenômenos, as questões e os dilemas que envolvem os consensos e as resistências
na produção dos discursos e dos sujeitos do mundo contemporâneo são
reconhecidos mundialmente.
Nessa edição do CIAD seus participantes terão a oportunidade de assistir a
três conferências fundamentais para a compreensão das várias e diversas
relações entre os sujeitos de uma sociedade e os discursos que os constituem e
circundam. Sabemos que em diferentes condições de produção podem prevalecer
entre os sujeitos e os discursos relações de distintas modalidades, entre as
quais ocorrem a repetição, a identificação, a indiferença, o afastamento, a
resistência, a oposição ou a repulsa. Tais relações serão amplamente exploradas
nas conferências dos professores Marc Angenot, da McGill University,
Philippe-Joseph Salazar, da University of Cape Town, e Jean-Jacques Courtine,
da Université de la Sorbone Nouvelle e da University of Auckland.
O Prof. Angenot é especialista em História das
ideias, em Nova Retórica e em Análise do discurso, titular da cátedra de Teoria
do discurso social da McGill University, membro da Société Royale du Canada e
autor de dezenas de obras, entre as quais destacamos La parole pamphlétaire (1982),
1889: un état du discours social (1989), Les idéologies du
ressentiment (1994) e Dialogues des sourds (2008).
Já o Prof. Salazar foi discípulo de mestres do
pensamento francês, tais como Roland Barthes, Georges Dumezil e Louis
Althusser. Entre 1998 e 2004 foi o diretor do seminário Rhétorique et
Démocracie e a partir de 2004 tornou-se Distinguished Professor of Rhetoric
da University of Cape Town. Também é autor de um grande número de publicações,
das quais destacamos Truth and Reconciliation in South Africa (2007) e Paroles
de Leaders (2011).
Além dessas conferências, o IV CIAD contará com três
mesas-redondas, das quais participarão os professores Marlène Coulomb-Gully, da
Université de Toulouse / Jean Jaurès; Valdir Heitor Barzotto, da Universidade
de São Paulo, Kátia Menezes de Souza, da Universidade Federal de Goiás, María
Alejandra Vitale, da Universidad de Buenos Aires, Pedro Navarro, da
Universidade Estadual de Maringá; Antônio Fernandes Júnior, da Universidade
Federal de Goiás, e nas quais serão abordados a produção dos consensos e a
conquista das resistências na Mídia, na Política e nas Ciências da Linguagem.
Ou seja, o que é dito hegemonicamente ou ao menos de modo bastante predominante
nesses campos do discurso? Há resistências que se contrapõem a essas hegemonia
e predominância? Quais são elas, como se processam e que alcances possuem?
Essa seleta programação
do IV CIAD será ainda
adensada por sua já tradicional apresentação dos principais grupos de pesquisa
em Análise do discurso do país, que, por sua vez são representantes, das várias
tendências dos estudos discursivos produzidos no Brasil e no exterior. Em
conjunto, a realização das conferências e das mesas-redondas, as apresentações
dos grupos de pesquisa e a participação de todos aqueles que tomarão parte no
evento concorrerão para que possamos mais bem compreender as formas e os
funcionamentos dos consensos desejáveis, mas também dos inaceitáveis, porque
nos limitam às repetições alienantes, e para que possamos mais bem conhecer as
resistências que já lhes foram feitas, com vistas a nos munirmos de um saber
cada vez mais sólido sobre como proceder para produzirmos nossas tão
necessárias lutas contra todos os poderes que nos pretendem dominar, explorar e
reduzir a máquinas de produção e consumo, que obedeceriam sempre e muitíssimo
bem aos comandos: “Produza, consuma e não se rebele jamais!”
As inscrições com
apresentação de trabalho devem ser realizadas até 20 de junho de 2015.
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